A terapia gênica será possível para Anemia Falciforme e Talassemias?

O que a genética e a terapia gênica pode oferecer para o tratamento da anemia falciforme e talassemias é relatado neste post.

Todos sabemos que todas as nossas características são “escritas” numa sequência de de moléculas denominadas de ácidos nucleicos, são elas o nosso DNA e RNA, que por sua vez formam os genes. São essas moléculas que além de informar como seremos também são responsáveis por muitos problemas de saúde. Essas doenças são chamadas de genéticas exatamente por se tratar de alterações nos genes. Na medicina são diversas, muitas das quais área de estudo da Genética Médica. No campo da Hematologia também ocorre diversas patologias de origem genéticas, mas sem dúvidas as mais comumente citadas são a Anemia Falciforme e Talassemias.
A primeira trata-se de uma alteração genética que leva a substituição de um aminoácido, que por sua vez modifica a hemoglobina. Essa modificação é que está na origem de todas as complicações que ocorrem nos pacientes com Anemia Falciforme. A Talassemia, por sua vez, é um defeito genético que ocasiona a redução ou mesmo a não produção de hemoglobina e, consequentemente, anemia que possui grau variado de gravidade.

Uma característica comum a ambas doenças é que muitos pacientes possuem redução expressiva da qualidade de vida, com internações frequentes, transfusões sanguíneas, infecções, entre outras. Felizmente terapias de suporte nas últimas décadas permitiram avanços significativos no tratamento de pacientes com a doença falciforme e talassemias permitindo assim sobrevida progressivamente maior e menos lesões em órgãos-alvo.Sickled red blood cells among typically shaped red blood cells

Hemácias falciformes. Crédito de ilustração: U.S. National Library of Medicine

Por outro lado, não há uma cura para essas doenças, exceto se submetidos ao transplante de células tronco, opção nem sempre viável para muitos. a esperança de uma terapia genética seria a possibilidade de cura para tais patologias cuja origem está bem descrita em determinadas alterações genéticas. Isso parece ser de fato uma possibilidade mais viável! Estudo recentemente publicado no renomado periódico médico americano New England Journal of Medicine mostrou que a partri de “manipulação” de genes doentes corrigindo-os pode-se levar a melhora de doenças genéticas. A publicação em questão reporta a pesquisa realizada com pacientes portadores de Anemia Falciforme grave, ou seja com alguma ou mais de uma de complicações como acidente vascular encefálico (cerebral) prévio, frequentes fenômenos vaso-oclusivos (crises álgicas, de dor) ou priapismo e estavam em programa de transfusão crônica ou recebendo hidroxiureia.

O que foi feito?

Células progenitoras autólogas (da própria pessoa) foram separadas e submetida a manipulação por meio de um agente viral que levou a redução da expressão do gene denominado BCL11A. Esse gene é relatado como repressor da produção de hemoglobina fetal HgF, grande trunfo na terapia de pacientes falciformes. Assim a antagonização de um gene repressor permite a produção da HbF e, consequentemente, aumento dessa proteína nos pacientes. As células foram reinfundidas nos pacientes após a manipulação posteriormente a um procedimento de condicionamento, semelhante ao que ocorre em alguns transplantes de células tronco. As principais complicações do procedimento foram relacionadas ao condicionamento, mas todos 6 pacientes do estudo toleraram. O mais importante é que após a infusão das células manipuladas houve expressiva redução nas crises de dor, necessidade de transfusão, eventos que ocorriam previamente.

Melhora dos níveis de hemoglobina F . Crédito de ilustração http://www.nejm.org

No mesmo periódico há outra publicação em que é relatada pesquisa com pacientes com anemia falciforme e talassemia. Nesse artigo a edição dos genes é realizada utilizando a técnica CRISPR, “alvejando” o mesmo gene BCL11A. Os resultados, ainda preliminares, pois é apenas um anos de seguimento são verdadeiramente promissores. Principalmente tendo em vista a gravidade dos pacientes e como houve mudanças significativas na evolução da doença após a terapia, com melhora dos sintomas, independência de transfusão, entre outras (vide gráfico).É uma ótima notícia do avanço da hematologia rumo a um futuro em que cada vez mais a biologia molecular contribuirá para tratamentos e melhoras na vida das pessoas.

Deseja saber sobre o que é CRISPR? Veja o site (em inglês) a seguir: https://www.livescience.com/58790-crispr-explained.html

Referência dos artigos do texto pode ser conferido no site (também em inglês): 

https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2029392?query=featured_home

https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2031054?query=featured_home

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Deficiência de glicose 6 fosfato desidrogenase (G6PD)